Rodrigo James, 35 anos, publicitário, jornalista, assessor de imprensa, dj amador, músico de computador, diretor de rádio lê, ouve, escreve, fala e respira cultura pop. Também atende nos websites www.programaaltofalante.com.br, www.portal180.com.br, no Orkut (http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=1365547244323894215), no MSN (tá bom que eu vou dar meu MSN assim assim) e está aberto a opiniões, crítica, chacotas e o que mais passar por sua cabeça. Ah, o email para contato é r.james@terra.com.br

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Texto escrito por este que vos fala e publicado em nossa coluna "Esquema Novo" no jornal Hoje em Dia, hoje:

REFLEXÕES SOBRE O MALTRATADO SHOWBIZ BRASILEIRO


O assunto da semana no showbiz brasileiro não foi outro: o caos na venda de ingressos para os shows do U2, em fevereiro, no Brasil. Filas quilométricas, postos de venda despreparados para o movimento gigantesco, reclamações de todas as partes e trocas de acusações entre organização, patrocinadores e demais envolvidos no processo mostraram não só a precariedade e fragilidade do segmento no Brasil, como também nos levaram a algumas reflexões.

A declaração de Alexandre Accioly, um dos promotores do evento, é sintomática: “Quando olho para trás, vejo que é uma pena não ter uma bola de cristal para saber que tanta gente iria tentar comprar ingressos.” O depoimento por si só já é um sintoma do seu despreparo para promover um evento deste porte. Em qualquer país do mundo (primeiro, segundo, terceiro ou qualquer outro mundo que venha a ser inventado), um show do U2 é sinônimo de sucesso imediato e não são poucas as vezes em que os ingressos se esgotam em questão de horas. Não é à toa que a turnê Vertigo foi a vice-campeão de público e bilheteria na temporada 2005, só perdendo para os Rolling Stones. Como se isso não bastasse, há algumas semanas problema semelhante aconteceu em nosso país vizinho, o Chile, quando as vendas foram abertas para os shows da banda por lá. Bastava a Accioly prestar atenção nas notícias para perceber que está lidando com algo muito maior do que ele imagina.

Fatos como estes só vêm comprovar a teoria de que o Brasil, por mais que as condições financeiras favoreçam, ainda não está preparado para eventos deste porte. O histórico de problemas em grandes eventos musicais é extenso e vão desde confusões na venda dos ingressos até problemas estruturais (quem não se lembra do Close Up Planet, em 1998, quando o palco em que Bjork e Prodigy iriam se apresentar, envergou, causando o cancelamento do show?), passando pela precariedade de grande parte dos locais destinados para os eventos. A grande pergunta que se faz é: até quando? Será que o carente público brasileiro, que tanto espera e sonha com apresentações em terras brasileiras de seus artistas prediletos, vai ser sempre obrigado a se sujeitar a empresários inescrupulosos que só visam o lucro em detrimento da música, do entretenimento e da diversão? Ganhar dinheiro não é problema e é uma necessidade para todos, mas seria pedir demais a estes empresários se preocuparem com algo mais que isso?

O mais irônico da história toda é que nem tudo é assim. No cenário independente, a coisa funciona de uma maneira bem diferente. Os festivais voltados para o público consumidor de música independente pipocam pelo país e mostram uma organização impecável. Não só os veteranos, como o Abril Pro Rock ou o Goiânia Noise, mas os novatos na cena, como é o caso do Varadouro, de Rio Branco, demonstram que a vontade é o fator primordial para que um evento seja bem sucedido. Financeiramente nem sempre, mas nem é esta a tônica de um evento independente. Aí sim a preocupação com o lado artístico é mais importante e todos os detalhes de funcionamento do evento em si são sempre levados em consideração e fiscalizados pelos próprios organizadores. A palavra não poderia ser outra: amor. O carinho demonstrado pelos organizadores destes festivais para com seus eventos é comparável a de um pai para com seu filho.

As soluções para a resolução destes problemas não são difíceis de serem imaginadas, mas na grande maioria dos casos são incompatíveis com a realidade. Muito se fala na formação de profissionais de produção cultural e na necessidade de gente mais capacitada para isto. O grande problema é que nem sempre estes profissionais são os responsáveis pela captação dos recursos necessários para a realização dos eventos. O ideal seria uma parceria, mas também acontece em raros casos. Os bons profissionais de produção cultural existem e estão espalhados pelo país às centenas, mas a impressão que o atual panorama do showbiz brasileiro passa é a de que cada vez mais empresários gananciosos e despreparados estão tomando conta do mercado simplesmente porque conhecem as pessoas certas e – repetindo mais uma vez, para ninguém se esquecer – visam somente o lucro.

É importante frisar que os problemas que frequentemente acontecem nos eventos de grande porte não são uma exclusividade brasileira. A todo momento pipocam pela imprensa mundial relatos de acidentes, shows cancelados por questões relacionadas a organização e até de problemas similares aos acontecidos esta semana em São Paulo, mas a coisa na prática é bem diferente. A freqüência com que isto acontece lá fora é bem menor e, comparados os tamanhos dos mercados, a porcentagem de problemas aqui é infinitamente maior. Acontece que uma multidão de 50, 100, 200 mil pessoas é incontrolável em qualquer parte do mundo e a possibilidade de um problema mais grave acontecer paira como uma nuvem negra sobre o próprio evento. O maior exemplo talvez seja a fatídica edição do Festival de Roskilde, na Dinamarca, em 2000, quando nove pessoas foram pisoteadas durante uma apresentação do Pearl Jam, levando a banda a não mais se apresentar para públicos superiores a 40 mil pessoas. Mas ao mesmo tempo, o grande marco em termos de mega-eventos – o festival de Woodstock, em 1969 – aconteceu no maior clima paz e amor, sem maiores problemas.

Para evitar que problemas como estes aconteçam, é necessário um preparo ainda maior dos responsáveis pelo evento, uma troca de informações mais freqüente entre eles e uma observação detalhada – agora falando especificamente dos brasileiros – do que acontece lá fora. A impressão que passa é que os organizadores brasileiros não têm esta preocupação e acreditam serem sempre capazes.

O triste desta história toda é que em último lugar na escala de prioridades vem sempre o público consumidor. Destinado a pagar preços altos (os R$ 200,00 cobrados por um ingresso de pista para os shows do U2 são os mais caros de toda a turnê da banda), enfrentar filas de dois dias sob condições adversas, acreditar em promessas que jamais serão cumpridas por parte dos organizadores dos eventos, assistir aos eventos em estádios, ginásios ou casas de show geralmente despreparados para abrigá-los e continuar sonhando em conseguir algum dinheiro para assistir a seu artista predileto em alguma cidade do hemisfério norte, onde tudo realmente funciona.

Mas nem tudo está perdido. Vem aí o show dos Rolling Stones, dia 18 de fevereiro, de graça, na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Um milhão e meio de pessoas é a expectativa de público.

Torçam para que tudo dê certo por lá. (RJ)