Rodrigo James, 35 anos, publicitário, jornalista, assessor de imprensa, dj amador, músico de computador, diretor de rádio lê, ouve, escreve, fala e respira cultura pop. Também atende nos websites www.programaaltofalante.com.br, www.portal180.com.br, no Orkut (http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=1365547244323894215), no MSN (tá bom que eu vou dar meu MSN assim assim) e está aberto a opiniões, crítica, chacotas e o que mais passar por sua cabeça. Ah, o email para contato é r.james@terra.com.br

domingo, janeiro 13, 2002

E No Dia Seguinte...

E no dia seguinte, ela acordou. Atônita, sem saber muito o que havia acontecido. Havia um gosto amargo lá no fundo da boca que se transformava num gosto agradável com uma simples troca de pensamentos.

Não pensou muito se deveria se levantar. Só sabe que um impulso a fez colocar os pés no chão e rumar para o banheiro. Afinal, é assim que deve ser. É como fazia todas as manhãs. Mas aquela parecia diferente, só não sabia o porquê. Alguma coisa lhe dizia que o gosto amargo tinha algo a ver com tudo.

Se olhou no espelho. Seu rosto parecia o mesmo, mas algo estava diferente. Olhou para os lados. Não viu nada diferente. Lavou o rosto, escovou os dentes, passou as mãos no cabelo e voltou para o quarto. Tinha a sensação de ter perdido algo. Conferiu a bolsa, o celular, as chaves do carro, o controle remoto do portão da garagem....estava tudo lá.

Desceu as escadas cuidadosamente. Estava um pouco sonolenta ainda. A cozinha, deserta, se abria para ela, chamando-a para aquele delicioso café da manhã dos domingos. Estava tudo lá. Como no domingo passado. Os pães, as frutas, o leite, o cereal. Mas algo a incomodava. Achou que fosse o gosto do cereal em sua boca. O gosto amargo em sua boca misturado com o gosto do cereal causava um efeito deveras interessante, mas trazia recordações.......de que seriam ? Não sabia.

Ouviu o telefone tocando. Atendeu. “E aí ? Tudo bem ? Sobreviveu ?” Essa palavra dizia tudo. Sobreviveu a quê ? “Quero saber tudo. O que aconteceu ?” Como assim ? Aconteceu algo ? Algo estava definitivamente errado. Não havia bebido, não havia se drogado e se lembrava direitinho de ter chegado em casa. Não gente, eu não sei o que aconteceu, se é que aconteceu alguma coisa. Outra ligação. “Mas você, hein ? “ Eu o quê, porra ???

Voltou para o quarto, atordoada. Sentia que havia algo de errado, mas não sabia como resolver. Deitou-se. Revirou na cama. Pegou o celular e conferiu as últimas ligações. Tudo normal. Se lembrava de todas. Foi ao carro e olhou dentro. Tudo normal. Conferiu a quilometragem. Normal.

Sentou em frente à tv e vegetou um pouco enquanto tentava desvendar o mistério. Mas não havia mistério algum ! Era tudo fruto da imaginação de suas amigas ! Mas aquele gosto amargo na boca não a deixava em paz. Comeu um bombom bem doce. O doce se misturou com o amargo por alguns momentos mas logo desapareceu. A sensação tomava conta de seu corpo. De repente sentiu que seu corpo inteiro estava amargo. Não conseguia se desvencilhar daquilo. Foi ficando desesperada. Até o telefone tocar novamente.

“Oi. Tudo bem ?” Ah, é você. Você nem sabe o que está acontecendo. E eu nem sei se posso te contar. Ou se devo. “Você está bem ? Ontem estava ótima.” É, estou sim, apesar de um gosto amargo na boca. “Eu sei. Também estou com esse gosto. Engraçado, não ?” É. Muito engraçado. “Mas você não tem a impressão que este gosto amargo vai se transformar daqui a pouco em algo doce ?” Não sei. O que te faz pensar nisso ? “Não sei também. Só sinto.” Bom, vamos ter que esperar algum tempo para sabermos. Horas, dias, meses, talvez nunca, né.....”É. Talvez ele desapareça.” Verdade. “O que vai fazer hoje ?” Não sei. “Vamos ao cinema ?” Pode ser. “No final da tarde ?” Ok. “Eu te ligo então mais tarde”. Combinado. “Então tchau”. Tchau.

Desligou. Algo estava diferente. Uma sensação de alívio tomou conta do seu corpo. Correu para o espelho e se olhou. Estava tudo certo. Nada havia mudado. Voltou para o quarto e se deitou. Sentiu o amargo tomar conta de seu corpo de novo, mas desta vez o amargo era agradável. Havia se acostumado com ele. Sua boca agora estava tomada por ele, mas já o aceitava. Era amargo sim, mas aceitável.

Abriu um sorriso e fechou os olhos por um instante. A noite anterior passou por sua cabeça como um raio e percebeu que o amargo nada mais era do que um gosto. Não era mais do que isso. Mas ainda era amargo.